Um dos remédios mais polêmicos e mais criticados é a morfina, um analgésico forte usado para o tratamento da dor. A morfina é amplamente usada, sendo os Estados Unidos o país com maior consumo em todo o mundo.
A morfina ganhou seu primeiro e intenso tabu na primeira guerra mundial, onde os soldados receberam ampolas de morfina para usar em casos de ferimentos e dores fortes. Entretanto, a morfina foi usada de forma recreativa por muitos, sendo observado nos centros de reabilitação vários soldados que criaram dependência ao seu uso. Não havia controle no front de batalha.
Morfina, “se eu não te amasse tanto assim?”
Afinal de contas, a morfina causa ou não dependência? Eis uma dolorosa questão bastante simples de ser respondida pela ciência e extremamente complexa de ser aplicada na prática. Aos olhos analgésicos da ciência, a morfina não causa dependência e a ignorância (como todo preconceito) impede que os pacientes tenham acesso a este tratamento. Os serviços de saúde tem tanta burocracia, os profissionais desconhecem o seu uso adequado e os pacientes aceitam a dependência desde as histórias da grande guerra. Pude atender um paciente com câncer terminal e metástases dolorosas na coluna que se recusou a usar morfina por medo de causar dependência. Mesmo em sua reta final de vida. E o que aconteceu? Morreu sofrendo muito com suas dores.
Diversos estudos mostram que o uso controlado da morfina não causa dependência e, mesmo que o paciente use em excesso, é bem difícil se tornar dependente. Raros são os casos, ao contrário do que se imagina. Existe um conjunto de sinais e sintomas de dependência de drogas como morfina e heroína, a famosa e ousada “síndrome do peru molhado”, definida por tremores, pêlos arrepiados (pele de galinha), suor intenso, respiração rápida, temperatura do corpo elevada, ansiedade, dores musculares e os clássicos olhos esbugalhados. Não é o “seu peru” da escolinha não 🙂
E porque é tão forte o preconceito contra o uso da morfina? Simples, ninguém quer passar perrengue. Já viram o estado que ficam os dependentes de álcool e outras drogas? Por isso, existe uma forte corrente que condena o uso destes tratamentos. Mas, quem trabalha atendendo pessoas com dores que não melhoram, sabe que a morfina é um aliviado e não inimigo.
Vale lembrar que, assim como a morfina, os analgésicos fortes (opioides) também andam sofrendo preconceito. Estima-se que o uso individual por ano possa ser de 192.9mg e o brasileiro usa 7.8mg ao ano, um valor 25 vezes menor do que o preconizado.
Morfina: eu não te amo!
Artur Padão