Um dos ditos do estudo da dor mais populares é “Dor que Alivia Dor”. Ou seja, eu provoco um estímulo doloroso em uma pessoa que já está sentindo dor e…ambas as dores melhoram. Como assim? Isso varia desde um beliscão, alongamento doloroso até mesmo balde de água gelada. Mas, não se engane: dor alivia dor sim, é verdade essa mirabolante afirmação.
Assim como dizem os ditos populares que para curar um amor perdido nada como um amor novo, a dor também segue o mesmo caminho. Quando vamos passear pelo sistema nervoso e sua maneira peculiar que produzir analgesia (ligar os comandos de aliviar a dor), surgem 2 formas principais de reagir a estímulos potencialmente ou já dolorosos: a via analgésica de baixo para cima (bottom —> up) e a via analgésica de cima para baixo (top —> down). Ambas receberam um poder neuronal divino de “derramar Senhor” endorfinas, serotoninas e noradrenalinas (nossos analgésicos naturais) para aliviar a dor.
Pense que você quer um aumento do seu salário, quem você procura? Seu gerente, claro. Depois o gerente vai no RH, que depois vai no supervisor geral e finalmente chega no Chefe (Pain Boss). Sua solicitação (periferia) chegou até seu chefe (central). Essa é a via baixo para cima (bottom —> up), que pinga analgésicos à medida que vai subindo dos nervos e neurônios periféricos (gânglios das raizes dorsais e gânglios trigeminais) em direção ao cérebro, mas que passa pela lâmina II do corno posterior da medula espinhal e tronco cerebral. Se seu salário aumentar então parabéns, sua solicitação analgésica foi atendida e pagando a rodada para todos no bar.
Agora, vamos no sentido contrário. Sua empresa recebeu um bônus e a partir de agora o salário de todo mundo aumentou. A ordem veio do Chefe, que passou para o supervisor geral, que por sua vez avisou ao RH e todo mundo ficou sabendo (inclusive você). Essa é a via analgésica de cima para baixo (top —> down), mais potente que a sua irmã analgésica e grande responsável neurocientífica pela “Dor que Alivia Dor”. Sendo o cérebro o Chefe, representa a integração de diversas áreas como o córtex motor, pré frontal, giro do cíngulo e tálamo e que derrama analgésicos até a periferia.
Sendo assim, temos o poder neuronal pessoal de ter auto controle sobre as dores que surgem no nosso dia a dia, pelos mais diversos motivos. “Já levou 500 socos na cara em uma noite só? Depois de um tempo começa a doer”, já dizia o poeta Balboa, figura caricata do estudo da dor e do cinema, pai moderno da Modulação Condicionada da Dor que é o paradigma que estuda “Dor que Alivia Dor”. Esse é um papo para uma rodada pós aumento de salário (analgesia, claro).
Artur Padão