A dor é uma queixa bastante comum no atleta amador, de alto nível ou de fim de semana. Sentir dor é normal. Anormal é acontecer o tempo todo, ser insuportável ou limitar o esporte por um tempo prolongado.
A definição de dor da IASP (Associação Internacional para o Estudo da Dor) diz que nem toda dor significa lesão real. O atleta pode ter dor com lesão ou sem lesão ou descrever a dor como lesão. Não tem como dizer o que na verdade acontece mais, porém sabemos que tanto dor e lesões estão presentes em vários esportes. O que vai ser discutido é a correlação da própria definição de dor com a relação entre dor x lesão nos atletas.
“A dor como uma lesão real”
A dor é um fator de indicação de lesão, pois é o primeiro sintoma falado (gritar, gemer, reclamar) e sentido (proteger ou bater na região, mancar, dobrar, tirar o peso de cima). No esporte, é muito frequente também ter o inchaço, ficar vermelho, dificuldade de mover, o que indica a famosa inflamação. Isso, claro, dói. Existem muitas substâncias na inflamação que aumentam a dor por deixarem os receptores de estímulos perigosos (nocivos – nociceptores) e de movimento (mecanoceptores) mais sensíveis, então qualquer movimento mínimo pode gerar aumento da dor.
Algumas vezes as lesões são diretas, não vemos inflamação, mas dói demais. A lesão deve ser tratada no seu tempo esperado de recuperação. Muitas vezes conseguimos acelerar esse processo e o retorno ao esporte. Porém, se isso não acontece e a dor persiste podemos ter não só a dor ficando crônica, mas também uma lesão mal curada. Somamos isso a ansiedade, expectativa e ao medo de se machucar novamente, a cabeça vai pro espaço. Muitas vezes a dor ocorre pelo atleta (comum no de fim de semana) não estar acostumado com a atividade causando muitos estiramentos (alongamentos curtos e rápidos) nos músculos pela atividade (mínimas lesões), ficando com dor no dia seguinte e pior no outro dia seguinte.
“Nem toda dor significa lesão”
Lembro de quando trabalhava no voleibol do botafogo e vários atletas na proximidade do jogo contra o flamengo (infelizmente) tinham queixas de dor, sem ter acontecido lesão nenhuma. Quando passava o jogo, na semana seguinte, o treino era normal e sem dor. Outro caso era de um levantador que sempre que ele jogava mal, errava as bolas ou era criticado, fazia cara de dor e gestos como apertar o punho, sacudir a mão e alongamentos durante da partida. Apesar da “cena meio teatral”, a dor estava por lá.
Outro exemplo seria o atleta querer utilizar proteções o tempo todo como bandagens ou suportes, mesmo após o tratamento de sua lesão. As reações emocionais e comportamentais dos atletas podem provocar mais dor pela ansiedade, nervosismo e apreensão. Isso vai depender muito de como cada atleta encara os estresses, as exigências e suas funções individuais e coletivas no esporte, se for o caso. O mais interessante é que também perdiam rendimento. Como já falamos antes, dor não é sinônimo de lesão. Todas as dores devem ser valorizadas, mas nem todas mostram algum problema a surgir.
“A dor pode ser de uma possível lesão”
A dor como sinal de alerta no atleta pode mostrar que uma lesão está para acontecer.
São os casos em que o atleta treina ou compete com dor, perde rendimento, muito parecido com os comentários acima, mas apresenta reações emocionais e comportamentais diferentes. O cansaço antes do esperado pode ser um grande sinal de perigo. Quando o profissional conhece o atleta e os seus limites e potenciais, sabe quando a situação está se complicando. Levar o atleta no limite físico é um grande potencial de lesão, mas durante este caminho a dor pode estar presente e ser o meio termo da lesão. Uma vez um técnico que eu trabalhava mandou o atleta atacar 50 bolas sem errar. Na bola 15 iniciou a dor, na bola 25 ele se machucou. Claro que isso ficou marcante e nada mudava a opinião do técnico.
“Descrever a dor como se fosse uma lesão”
Essa é uma frase confusa. Dizer o que a pessoa sente (dor) é uma tarefa difícil e pessoal, pois a dor é tão subjetiva quanto o Vasco ser campeão ano que vem, pelo menos com esse time. Muitas palavras que usamos para ajudar a entender de onde vem a dor do atleta podem também mostrar que existe uma lesão: aguda, intensa, latejando, pulsando, o que chama a atenção. Porém, a palavra (qualidade da dor) é apenas uma das várias maneiras de ajudar. Pode acontecer de o atleta dizer que a dor é de uma lesão antiga, mesmo que já tenha sido curada. O cérebro e o músculo lembram-se da dor, mesmo que antiga, fica no HD cortical.
Contar como a dor é, para o atleta e para qualquer outra pessoa, passa por um processo super interessante no sistema nervoso, onde temos áreas específicas para dizer exatamente como é a experiência dolorosa (dimensão sensitivo descriminativa), cada uma da sua maneira; Por isso, mesmo que existam lesões de várias maneiras, cada pessoa reage de forma diferente (dimensão afetiva motivacional). Ex. Um atleta torceu o tornozelo de leve e teve uma dor horrível e ficou mancando, e outro com uma torção grave, conversava normalmente. Independente da lesão, a maneira de dar importância da dor, se vai sentir muito ou pouco, o quanto vai afetar a cabeça do atleta depende única e exclusivamente dele mesmo (dimensão cognitiva avaliativa).
Dentro da definição de dor, podemos entender alguns mecanismos da dor do atleta. Tudo vai depender de como nós vamos interpretar a dor, que é pouco valorizada e julgada de maneira inadequada.
Quer treinar como um atleta? Viva a vida de um atleta!
Artur Padão – Dorterapeuta